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29 de Maio de 2018

Discurso do Senhor Dr. António Costa, Primeiro Ministro de Portugal.

 

Temos com os Estados Unidos uma parceria duradoura, que se adapta aos desafios de cada era e que desejamos renovar.

Situado num dos extremos do continente europeu, o nosso país viu sempre na saída para o mar um encontro com espaços mais vastos de descoberta e de cooperação. Mais do que apenas um elemento de construção de identidade, a relação com o Atlântico e com as potências marítimas tem assumido um carácter permanente na nossa política externa. Essa circunstância torna incontornável a manutenção de um relacionamento profundo e estável com os Estados Unidos.

Tendências recentes poderiam contribuir para uma maior «continentalização» da nossa política externa: a crise económica e financeira internacional tornou patente a necessidade do reforço da coordenação e integração com os nossos parceiros europeus; o processo de saída do Reino Unido da União Europeia coloca riscos de afastamento em relação ao nosso aliado mais antigo e de vocação marítima, que desejamos minimizar; e um maior retraimento externo dos Estados Unidos gera desafios importantes para as relações transatlânticas.

Mesmo que não deseje ou tenha total controlo sobre alguns desses movimentos, Portugal tem de adaptar-se a eles, procurando preservar o equilíbrio que ao longo das décadas lhe proporcionou uma posição de centralidade no eixo das relações transatlânticas. Uma parceria renovada com os Estados Unidos assumirá um papel essencial nesse processo.

Os Estados Unidos são nossos aliados na NATO, país com o qual mantemos um abrangente Acordo de Cooperação e Defesa, parceiro na OSCE e em outras organizações multilaterais, lar de cerca de milhão e meio de cidadãos de origem portuguesa, 5.o cliente dos nossos bens, mercado para onde exportam mais de três mil empresas portuguesas, destino de formação de um número significativo dos nossos estudantes, académicos e cientistas. O nosso relacionamento com os Estados Unidos não assenta, assim, em fatores de natureza conjuntural, mas sobre uma base sólida e diversificada.

Gostaria de destacar, em primeiro lugar, o papel das comunidades portuguesas na criação de laços afetivos entre os nossos dois países. Um grande número de portugueses atravessou o Atlântico em diferentes vagas, por diferentes motivos, para diferentes regiões dos Estados Unidos. São já cerca de um milhão e meio os portugueses e luso-descendentes nos Estados Unidos, integrados em comunidades muito diversificadas e construídas em momentos diferentes da história do país.

Algumas antecedem em muito a própria independência dos Estados Unidos, que Portugal foi o primeiro país neutral a reconhecer. Estamos hoje em todos os setores de atividade, incluindo nos mais dinâmicos e tecnologicamente avançados da economia norte-americana.

Os portugueses deram – e continuam a dar – um contributo de relevo para a construção de uma sociedade norte-americana próspera, desenvolvida e plural. As inúmeras histórias individuais de sucesso testemunham a bem-sucedida integração na sociedade norte-americana e potenciam a capacidade de influência económica, social e política da nossa comunidade.

São conhecidas mais de 340 associações portuguesas ou luso-americanas, que permitem às nossas comunidades atuar de modo mais eficaz na defesa dos seus interesses ao nível local, estadual e federal. São disso bons exemplos o PALCUS – Portuguese American Leadership Council of the United States e a NOPA – National Organization of Portuguese-Americans. A presença de luso-descendentes em cargos eletivos de relevo reforça também a visibilidade e importância política da nossa comunidade, com destaque, ao nível federal, para os três Representantes da Califórnia no Congresso: Devin Nunes, David Valadão e Jim Costa.

Em vagas mais recentes, foram muitos os estudantes, académicos e cientistas que aprofundaram a sua formação ou iniciaram as suas atividades nos Estados Unidos, parte importante dos quais com o apoio de programas existentes entre os dois países, no âmbito da FLAD – Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, do Fulbright ou de outros mecanismos de cooperação.

De igual modo, o programa de parcerias internacionais, lançado em 2006 pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, permite uma colaboração estratégica entre diversas universidades e instituições de investigação portuguesas, universidades norte-americanas e parceiros industriais e empresariais, potenciando a aplicação comercial da pesquisa científica. Daqui resultou a bem-sucedida parceria MIT-Portugal, a par com as colaborações com Universidade do Texas, em Austin e o Carnegie Mellon.

O enorme sucesso do intercâmbio universitário e científico entre os dois países é confirmado pela importância da PAPS – Portuguese American Postgraduate Society, que celebra em 2018 vinte anos de existência. Esta troca de experiências e de contactos entre os indivíduos contribui para preparar a nossa parceria para os desafios do presente século.

Minhas senhoras e meus senhores,

Afirma-se por vezes que Portugal é onde a Europa termina, mas com a mesma validade se poderá afirmar que é onde ela começa. Portugal é um país aberto ao mundo e quer afirmar-se cada vez mais como uma porta de entrada no continente europeu do comércio e investimento dos nossos parceiros.

Os nossos portos situam-se na confluência de três importantes rotas marítimas: do Cabo, mediterrânica e transatlântica. Essa característica tem despertado o interesse na cooperação com os Estados Unidos, em particular na área da segurança energética. O número de terminais de GNL – Gás Natural Liquefeito tem vindo a crescer nos Estados Unidos, numa clara indicação de que a capacidade norte-americana de exportação deste recurso venha a aumentar exponencialmente no futuro.

O Porto de Sines tem o potencial para servir de ponto intermédio para outros portos na Europa e em África. Os dois países emitiram mesmo uma declaração conjunta, no ano passado, a sublinhar a importância estratégica do Porto de Sines como hub atlântico de GNL e da relação Portugal-EUA na promoção do GNL marítimo como fator de reforço da diversificação da segurança energética europeia, de melhoria do desempenho ambiental do transporte marítimo e de reforço da sustentabilidade da economia azul, com uma indústria geradora de empregos qualificados e inovação tecnológica. O Porto de Sines recebeu o primeiro transporte de GNL para a Europa em abril de 2016 e deverá manter-se com um destino importante para o GNL norte-americano.

Da mesma forma, é com natural satisfação que temos vindo a assistir ao interesse de grandes companhias norte-americanos do setor tecnológico em instalar bases no nosso país, como a Cisco e a Google. Essa tendência confirma que a aposta na qualificação da nossa força de trabalho, na melhoria das condições de atratividade do nosso mercado e na realização de grandes eventos tecnológicos, como a Websummit, tem produzido resultados. Cada vez mais, Portugal tem de tornar-se num destino óbvio para as empresas tecnológicas ou industriais norte- americanas que pretendam investir no continente europeu. Estamos empenhados em incentivar esse processo.

Minhas senhoras e meus senhores,

Os Estados Unidos mantêm uma ligação muito antiga com os Açores, que ao longo do tempo utilizaram como ponto de apoio para caminharem, ainda que com uma passada bem larga, entre os continentes americano e europeu. Mas os Açores não foram no passado e não são no presente apenas um caminho em direção a algo. Têm de ser cada vez mais o próprio centro de um conjunto de atividades com impacto positivo para as populações do arquipélago e para a cooperação internacional.

Situado num ponto de convergência oceânico entre vários continentes, o arquipélago teve sempre uma importância estratégica para nós e para os nossos parceiros. A sua relevância adapta-se aos desafios de cada era, mas não diminui. Como tem vindo a acontecer, queremos acolher os Estados Unidos nessa visão renovada sobre os Açores. Para além da cooperação que se prolonga há décadas entre os nossos dois países na área da Defesa, consideramos que faz todo o sentido manter os Estados Unidos envolvidos nos projetos em desenvolvimento do Air Center e do Centro de Segurança do Atlântico.

Minhas senhoras e meus senhores,

As comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas atravessarão este ano esse oceano que nos une, proporcionando-nos um momento simbólico único para celebrarmos a nossa aliança e uma longa história partilhada.

Participarei nessas celebrações, iniciando um extenso programa que me levará a Boston, Providence, São Francisco, Sacramento, Newark e Nova Iorque. De costa a costa, manterei contactos com as comunidades portuguesas que prolongam o nosso país por diferentes partes do território norte-americano, manterei um extenso programa de contactos com empresas e instituições financeiras na Califórnia e em Nova Iorque e, em todos os lugares, procurarei apresentar aos nossos parceiros norte-americanos a face moderna de Portugal.

Num enquadramento mais abrangente, todo o mês de junho, Mês de Portugal nos Estados Unidos, contará com um extenso programa de eventos culturais, artísticos, económicos e científicos para celebrar o nosso país, a nossa comunidade e as nossas relações com os Estados Unidos. Realizar-se-á em sessenta cidades de doze diferentes estados.

Foram muitos os europeus que no passado partiram para Novo Mundo em busca de maior prosperidade, dinamismo e espaço para a criatividade. Mas podemos afirmar que temos hoje novos mundos nos dois lados do Atlântico. Em Portugal, estamos a criar os fundamentos para uma economia voltada para os desafios do futuro, com incorporação de conhecimento, tecnologia e uma sólida base industrial. Queremos fazê-lo com a nossa tradicional abertura ao mundo e a participação dos nossos parceiros.

É essa a principal mensagem que levarei comigo na minha visita, acompanhada pelo empenho em construir com os Estados Unidos uma parceria renovada.